quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Curitiba - Paraná

(Publicado em junho de 1999)

Um modelo de cidade
Apontada como uma das melhores cidades para se viver em todo o mundo, Curitiba é uma unanimidade entre especialistas e leigos. A qualidade de vida que a cidade oferece a seus habitantes e exibe aos visitantes é resultado de um dinâmico processo de transformação iniciado há 25 anos.

Denominada como a Cidade Sorriso em tempos passados e Capital Ecológica mais recentemente, Curitiba faz parte do rol das cidades que se adaptaram ao ritmo de crescimento populacional sem deixar de lado as estratégias de planejamento que a tornam uma metrópole organizada e ciente de sua dimensão.

Um pedacinho da Europa aqui
A capital do Paraná é uma típica cidade que não aparenta ser brasileira. Fria no inverno e quente no verão, os habitantes de Curitiba são quase todos descendentes de alemães, poloneses, italianos e ucranianos, com a pele clara, os cabelos loiros e sobrenomes difíceis. A frieza da cidade não é disfarçada apenas com grossas malhas e pesados casacões. Ela se estende, inclusive, para a personalidade dos nativos.

Em um típico bar, chamado Churrasquinho de Gato (uma ironia, porque os espetinhos de alcatra, camarão e bacalhau são deliciosos!), minha mesa estava animada, contávamos piadas, comíamos e bebericávamos cerveja sob calor atípico e céu bem estrelado. Um piá (como eles chamam os garotos) da mesa ao lado se virou para ouvir as nossas piadas e contar uma das suas. Perguntou-nos de onde éramos e confessou: “Nasci no interior de São Paulo e vim morar aqui com apenas sete anos.” Percebemos, imediatamente, que não se tratava de um típico curitibano e ele reforçou nosso pressentimento: “Jamais um curitibano se viraria e se enturmaria com tal facilidade. Eles são muito reservados.”

Uma cidade plana, razoavelmente pequena e que abriga cerca de 1,5 milhão de habitantes, é feita de muitos recantos e para todos os gostos. Acomodada no sul do Brasil, junto a Serra do Mar, Curitiba, embora não carregue grande valor histórico (não passava de uma vila sem graça que servia apenas como parada de tropeiros que utilizavam a cidade para descansar), é dona de uma história rica de colonização iniciada no século 17. Foi, então, há um século que os imigrantes desembarcaram e a tal vila começou a crescer.

Para se ter noção do recente crescimento de Curitiba, quase metade de suas atrações surgiu em menos de 10 anos. Mesmo assim, alguma coisa de interessante haveria de existir para atrair cerca de 1 milhão de turistas por ano. Aliás, existem muitas coisas.

Não dá para perder tempo
Uma das atrações é, sem dúvida, o Jardim Botânico. A estufa art noveau, rodeada por um belo jardim, é uma réplica do Palácio de Cristal que existiu em Londres. Lá, é possível admirar várias espécies de plantas, flores e animais nativos que ficam soltos pelo parque e pelo bosque de dentro.

Como existem muitos parques em toda cidade, há um que se destaca, o Tanguá. Ele possui uma cascata artificial que despenca de uma grande rocha. Mesmo que seja artificial, os curitibanos não ligam, afinal, o que importa é o visual que ela proporciona e a tranqüilidade de poder passear nos dias de folga com a família.

O edifício centenário de uma antiga estação de trem foi transformado em um shopping center chamado Estação Plaza Show. Shopping, aliás, de uma forma como não estamos acostumados a ver, porque – mesmo tendo 130 lojas – o que menos se faz lá são compras. O legal dele é curtir o som da banda que toca no palco central, o boliche, o Parque da Mônica e o cinema da Universal Studios, além do Museu Ferroviário, com uma locomotiva do início do século. Há, também, fast food, restaurantes e bares, inclusive um, o Plaza Bier, adquirido recentemente pelo atual técnico da seleção brasileira de futebol, Wanderley Luxemburgo.

A Ópera de Arame, como o próprio nome diz, não passa de um teatro feito de arame, semelhante à Ópera de Paris. Simples assim, mas que enfeita a cidade e atrai visitantes dos quatro cantos. Experimente dar uma espiada durante um espetáculo: as luzes de dentro e, principalmente as de fora, se acendem e você não sabe escolher entre a apresentação do show de dentro ou o espetáculo da iluminação de fora.

Comer, comer
No bairro de Santa Felicidade, que já foi cenário de uma novela global, dezenas de famílias italianas se instalaram e abriram cantinas com o melhor da gastronomia internacional e dos vinhos caseiros. Um dos restaurantes, inclusive, entrou para o Guiness Book, o livro dos recordes: existem quatro mil lugares para se jantar nele. Tanto fascínio pela gastronomia explica a frieza dos curitibanos: sair de casa e se trancar em um restaurante, ou apenas acender a lareira e apreciar uma fondue de queijo, chocolate ou carne. Porque um dos prazeres que os moradores da cidade sabem fazer e bem: comer, comer...

O nome do bairro surgiu porque dona Felicidade Borges, ao fazer doação de uma área de terras para o patrimônio da colônia, pediu que o local levasse o seu nome. O pedido foi respeitado e o espírito religioso motivou o acréscimo de "Santa" ao nome da doadora.

Mesmo tendo olhos apenas para o próprio umbigo, a capital paranaense não se esquece de suas origens e homenageia o povo ucraniano com a abertura do Memorial da Imigração Ucraniana. Ele foi criado, entre outros, há três anos para marcar um século da imigração desse povo. Serve, também, para mostrar as tradições ucranianas, tais como os ícones (pinturas religiosas) e as pêssankas (ovos pintados à mão), que “simbolizam uma infinidade de coisas simples e boas que uns desejam aos outros até a eternidade”.

Pioneirismo
O primeiro calçadão brasileiro (espaço exclusivo para pedestres) foi inaugurado lá, em 1972, na rua XV de Novembro, conhecida como rua das Flores, no centro da cidade. Tornou-se ponto de encontro e de lazer, no qual, aos sábados, pequenos artistas tomam conta do espaço e as pessoas comuns praticam o footing dominical.

Foi lá, também, que surgiu uma rua na qual o comércio fica aberto durante 24 horas e não fecha há sete anos. São bares, farmácias, revistaria, loja de artesanato, banco 24 horas, floricultura, praça de alimentação e mercadinho sempre à disposição da população, num espaço de arquitetura moderna e funcional. É totalmente coberta por vidro transparente e a estrutura é feita por um tubo metálico em forma de arco, numa concepção totalmente futurista. Rua essa que não passa de um corredor, com lojas dos dois lados, mesinhas espalhadas pelo meio e muita gente circulando por lá. Um tal de sobe e desce, taças de chope rolando pela madrugada e, aos sábados à noite, muita gente mau encarada.

Andando de lá para cá
Para levar os turistas, a cidade conta com um ônibus chamado Jardineira. Ele vai parando em 22 pontos turísticos da cidade e dá chance de eles descerem três vezes durante todo o percurso com apenas uma passagem.

O sistema de transporte coletivo é mais uma inovação curitibana. Lembra um pouco filmes de ficção científica. Os moradores deram apelido de estações tubo, que nada mais são que cápsulas futurísticas. Lá, o passageiro compra um bilhete (na verdade é uma moeda) e pode trocar de linha do ônibus sem precisar pagar outra passagem. A circulação pela cidade é rápida e segura, garantida por um sistema trinário de vias, com canaletas exclusivas para o transporte coletivo e pistas para os deslocamentos velozes.

O trânsito, conseqüentemente, não fica caótico, como estamos começando a presenciar em São Paulo. As pessoas, então, optam por pegar o ônibus, descer “três tubos depois”, e chegar ao local desejado sem maiores complicações.

Subindo ao pódio
Curitiba recebeu o título de capital ecológica do país com 14 parques e bosques. São mais de 50 metros quadrados de área verde por habitante (quatro vezes mais que o recomendado pela Organização das Nações Unidas). É por isso que a entidade incluiu Curitiba entre as três cidades do mundo com a melhor qualidade de vida. E ela recebeu, também, o título de cidade-modelo de nosso país não só porque a maioria de seus habitantes pertence à classe média e os produtos a serem lançados destinados a ela saem lá primeiro, mas porque, de certa forma, tudo funciona.

Como todo exemplo de cidade, em Curitiba nada se destrói, nada se derruba, tudo se recicla. As residências e as empresas possuem dois lixos: um de material orgânico e outro de material reciclável. Sendo assim, existem dois caminhões que fazem a coleta em dias alternados para retirar os lixos produzidos. Em um dia são os restos de alimentos; no outro, plástico, papel, alumínio e vidro. Para retribuir a colaboração dos moradores, o governo devolve plantando árvores, construindo parques e melhorando as escolas públicas. Tudo para uma qualidade de vida melhor. Lixo no chão ou voando de uma janela? Difícil de se ver.

Mãos à obra
Se você ainda não descobriu porque não voltaria para casa com o mesmo pensamento depois de conhecer Curitiba, é hora de fazer as malas. Ou melhor, é hora de cobrar o governo por melhorias no transporte; é hora de efetivar a reciclagem do lixo; é necessário o plantio de mais árvores e de um cuidado excessivo da cidade em que vive. Mas, como pontapé inicial, se começar pelo seu condomínio e depois se estender para o seu bairro, já está de bom tamanho.

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